Adam Curtis é pop!
O documentarista britânico é inspiração para a turnê da banda Massive Attack.
“…o mapa que temos atualmente em nossas cabeças não corresponde mais ao território em que estamos.” – Adam Curtis
A Crack Magazine, uma das melhores revistas de música da atualidade, publicou uma inusitada entrevista esta semana, inusitada por ser não com algum músico ou nova banda, mas com o documentarista britânico Adam Curtis, talvez o intérprete mais agudo das crises e angústias de nosso tempo.
Eis a entrevista para deleite de nossos assinantes:
Desde o final da década de 1980, o documentarista britânico Adam Curtis tem investigado as maneiras inesperadas pelas quais a política, a economia, a religião, a tecnologia e a filosofia se cruzam para criar o mundo em que vivemos. Suas falas fazem parte do atual show ao vivo do Massive Attack, que explora geopolítica, ação climática e desinformação. Nesta extensa sessão de perguntas e respostas, a autora Nathalie Olah fala com Curtis sobre as alterações climáticas e como a nostalgia e o doomerismo estão a afetar a nossa capacidade de nos organizarmos e de imaginarmos um amanhã melhor.
Nathalie Olah: Qual é a sua opinião sobre a atual discussão sobre as alterações climáticas?
Adam Curtis: Estou entediado pela forma como as alterações climáticas são discutidas porque parece ignorar completamente a questão central do poder. A discussão é dominada por… não por tecnocratas, mas por pessoas com mentalidade técnica; pessoas que pensam que se você conseguir de alguma forma diminuir a temperatura tudo ficará resolvido, e não acho que isso vá acontecer. O movimento contra as alterações climáticas não chegou a lado nenhum desde a conferência do Rio [Cúpula da Terra] em 1992. Nessa altura, os cientistas que concebiam o problema como um sistema que simplesmente precisava de ser estabilizado assumiram o controle e, por se tratar de um modelo poderoso, que se infiltrou em nossa sociedade como um todo.
NO: Você acha que existe um fenômeno semelhante acontecendo na política eleitoral; um anseio nostálgico por um momento em que o liberalismo parecia estar funcionando de forma mais eficaz?
AC: Sim, há muita nostalgia, de redefinir o que você tinha – mas se você olhar por baixo dos votos que esse novo governo obteve, é delicado. É interessante que os Trabalhistas tenham ignorado em grande medida o movimento verde, ou o movimento das alterações climáticas, no interesse de obter outros votos das cidades provinciais. Essa parece ter sido a estratégia deles. A nostalgia pode estar em jogo, embora possa ser muito cedo para dizer o quão difundida ela é. Há um grande desejo entre as ‘pessoas boas que pensam’ de que tudo simplesmente se aquiete tudo volte a ‘ser legal’ novamente.
NO: Você acha que é razoável que as pessoas façam comparações entre o clima cultural de hoje e o da Europa dos anos 1930?
AC: Não. Acho que é nostálgico ser brutal. O que está a acontecer aqui, em Gaza, é completamente novo. O tipo de sociedade que as pessoas ansiavam naquela época eram tecnocracias altamente centralizadas e controladas nas quais você, o indivíduo, desapareceria. É disso que tratava o fascismo em sua encarnação original. Vivemos agora em um mundo de hiperindividualismo. Não é isso que as pessoas querem agora.
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