Mas o que é a poesia?
Já nos títulos que nos convencem da “necessidade da poesia”, de sua vitalidade, de sua indispensabilidade existe algo que soa quase como uma capitulação.
Mas o que é a poesia?
Por Adam Zagajewski - in Em defesa do fervor
Alguém que folheie os catálogos das grandes bibliotecas, encontrará neles muitos títulos referentes à “defesa da poesia”. É quase um gênero literário particular que tem sua própria tradição honorável (tanto Philip Sydney, quanto Shelley e Benedetto Croce encontram-se entre seus clássicos); é ao mesmo tempo um gênero desesperado, contendo em si algo de quase total desilusão. Já nos títulos que nos convencem da “necessidade da poesia”, de sua vitalidade, de sua indispensabilidade existe algo que soa quase como uma capitulação. Se é que há necessidade de toda essa persuasão... Mais facilmente ainda podem nos convencer autores tais como Iosif Brodski[1], que defende a poesia com imensa paixão – e com uma arrogância admirável! – e com sucesso empurra o oponente para uma defensiva desesperada (infelizmente, no geral, o oponente nem sabe que se encontra nocauteado; afinal, as defesas da poesia são lidas apenas por seus amigos!).
O que a poesia é, felizmente, não sabemos exatamente, e de maneira alguma precisamos saber de modo analítico; nenhuma definição (e elas são muitas) consegue formalizar esse elemento. Eu também não tenho ambições de defini-la. Mas há, entretanto, algo de sedutor em ver a poesia em seu movimento “entre” – como um dos veículos mais importantes que nos raptam para o alto, e em compreender que o fervor antecede a ironia. O fervor: o canto ardente do mundo, ao qual respondemos com o nosso próprio canto imperfeito.
Precisamos da poesia tanto quanto precisamos do belo (embora pareça que existam na Europa países nos quais essa última palavra esteja severamente proibida). O belo não é para os estetas, o belo é para todos aqueles que procuram um caminho sério; é um apelo, uma promessa, talvez não da felicidade, como queria Stendhal, mas uma grande e interminável jornada.
[1] Iosif Aleksandrovich Brodski (Josif Brodski em polonês e Joseph Brodsky em inglês) foi um dos maiores poetas e ensaístas russos do século XX. Expulso da União Soviética em 1972, emigrou para os Estados Unidos, adotando a cidadania americana. Ganhou o Prêmio Nobel de Literatura de 1987.
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